quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Obama supera incertezas e se reelege presidente dos EUA


 
Barack Obama fala um dos últimos comícios da campanha de 2012, no Estado de Iowa. Foto: AFP
Barack Obama fala um dos últimos comícios da campanha de 2012, no Estado de Iowa
Foto: AFP
Em 2008, os Estados Unidos conheceram o candidato Barack Obama. Em 2012, os Estados Unidos conhecem o presidente Barack Obama.
Foi uma mudança significativa, que gerou dúvidas e desconfianças em diversos círculos da sociedade americana, mas não grande o suficiente para impedir que o homem que fez história no passado voltasse a reescrever neste 6 de novembro para adquirir o direito de liderar os Estados Unidos até 2016.
Em 2008, Obama era o candidato que apresentava o passado de superação da infância de dificuldades em direção ao brilhantismo no Direito de Harvard e à explosão antes dos 50 anos como senador e astro ascendente do Partido Democrata. Há quatro anos, Obama, o negro nascido no Havaí com um Hussein como nome do meio, simbolizava o americano que transcende raças e nações.
Tudo isso ainda estava em jogo e contava a seu favor, mas, para manter-se no cargo, Obama necessitava deixar sua biografia pessoal de lado e lidar com a presidencial. Candidato da esperança desenfreada, do sonoro e coral "sim, nós podemos", o Obama candidato de 2012 precisou afastar-se do idealismo em direção ao realismo. E as promessas para seu proposto segundo mandato passaram necessariamente pelo saldo das suas conquistas e de seus fracassos.
Discordâncias
Onde os apoiadores de Obama veem vitórias, seus críticos veem derrotas. Esta discordância, bastante comum e mesmo esperada em embates ideológicos - sobretudo de uma sociedade politicamente marcada por uma ainda forte lógica bipartidária -, possui basicamente duas versões, que muitas vezes se sobrepõem. A primeira é uma discordância baseada na insatisfação com os resultados; a segunda é uma discordância causada pela posse de premissas filosóficas diferentes.
Pertencente à primeira classe de discordância está, essencialmente, a política econômica. Os números estão aí: os gastos federais aumentaram, a dívida federal cresceu, e o desemprego exibe ainda um número expressivo. Os críticos de Obama enxergam nisso um fracasso: acreditam que os gastos já deveriam ser menores e o desemprego, sobretudo, ter sido extirpado. Os apoiadores do presidente veem nisso, se não uma vitória, algo esperado: como disse Bill Clinton, "nenhum presidente teria solucionado a economia que Obama encontrou".
Essa disputa potencialmente interminável entre a satisfação e decepção com os resultados econômicos da atual Casa Branca pertencem ao um nível muito real do debate da sociedade americana: o emprego e o salário, entidades míticas da cultura do país, importam a todos, e é de se esperar que haja discordâncias de graus sobre até onde Obama foi poderia ter ido em quatro anos.
Mas a discordância gradual sobre a economia de Obama, absolutamente central à campanha dos republicanos, é seguida de temas marcados por discordâncias que emergem das premissas radicalmente distintas filosóficas defendidas por democratas e republicanos. Essas discordâncias, que permeiam a grande maioria dos debates sobre a biografia presidencial de Obama, apontam, mais que tudo, para que futuro os Estados Unidos querem e podem ter.
Diretamente ligado à economia está Medicaid, programa que prevê a expansão da parcela da população dotada de seguro de saúde. O projeto, votado e aprovado em 2009, foi ratificado pela Suprema Corte em 2012. O Obamacare, como ficou conhecido, obriga os menos abastados a contrair um seguro de saúde - dos quais muitas vezes abrem mão por não ter dinheiro; o governo, em contrapartida, financia grande parte dos custos.
Clássica demanda dos democratas assumida com afinco pelo presidente, o programa é um dos grandes trunfos de Obama. Para os republicanos, trata-se de um programa visto com vistas tortas, pois aumenta os gastos federais e interfere na liberdade das pessoas - duas bandeiras caríssimas ao Grand Old Party.
Bandeiras democratas
Na esteira das questões diretamente ligadas à economia, Obama ostenta uma biografia marcada pela inclusão.
Militou contra a política do "Don't ask, don't tell" ("Não pergunte, não conte"), que proibia que se procurasse descobrir a orientação sexual dos oficiais militares e, na prática, restringia a existência militares homossexuais. Contra os conservadores religiosos, batalhou a favor da liberação da pesquisa de células-tronco. Colocou-se, também contra esses grupos, a favor da ampliação do direito ao aborto em casos de gravidez indesejada ou causada por estupro.
E, na contracorrente dos políticos de tendência xenófobos, sua administração foi marcada por uma maior tolerância com os imigrantes legais e ilegais dos Estados Unidos (neste âmbito, sua última ação, vista pelos republicanos como eleitoreira, foi flexibilizar o direito ao trabalho a jovens imigrantes ilegais).
Por fim, a política externa de Obama foi marcada, nestes quatro anos, principalmente pela tolerância e pelo o diálogo. Gerando críticas e ódios entre os republicanos, sempre evitou enfrentamentos diretos com outras nações, seja em conflitos mais diplomáticos (Rússia) ou econômicos (China) como no mais propriamente políticos (Irã) e belicosos (Síria). Cumprindo com o compromisso de campanha, reduziu e retirou todas as tropas no Iraque, invadido em 2003 durante a administração George W. Bush.
Essa postura contrária ao imperialismo não impediu, no entanto, que Obama aumentasse as tropas no Afeganistão - entendendo se tratar de um conflito complexo que exigia maior participação internacional - e mesmo mandasse tropas para o Paquistão para capturar (e matar) Osama bin Laden. Ele também falhou ao não conseguir o apoio necessário para fechar a Baía de Guantánamo, criada em Cuba para prender e julgar os acusados de terrorismo.
E, em um dos poucos momentos em que recebeu críticas da comunidade internacional como um todo, negou o pedido palestino da incorporação como membro pleno da Organização das Nações Unidas (o ato mostrava o quanto Obama, ainda que um militante democrata, se encontra atrelado ao lobby israelense, tão caro aos republicanos).
O futuro e a mudança
Obama, tal qual os republicanos, acredita que os Estados Unidos são o melhor país do planeta; no entanto, acredita que o século XXI apresenta uma estrutura política, econômica, social e ideológica diferente da predecessora, o que, por consequência, exige uma nova postura dos Estados Unidos. Trata-se de uma visão complexa, ainda em formação, e com a qual muitos americanos não se sentem à vontade.
"Eu mudei", disse Obama ao aceitar a nomeação na Convenção Nacional do Partido Democrata desde ano, realizada em Charlotte, na Carolina do Norte. "O caminho que oferecemos pode ser mais difícil, mas leva a um lugar melhor. E eu peço que vocês escolham este futuro", convocou, deixando um pouco de lado o sonho do idealismo a apostando no esforço do realismo.